É possível registrar o nome de ente público como marca?

Recentemente, a rede de supermercados britânica “Iceland Foods” (Islândia Alimentos) apresentou recurso contra a decisão proferida, em 2019, pelo Instituto de Propriedade Intelectual da União Europeia, o qual invalidou a exclusividade, ora concedida, da palavra “Iceland” na marca registrada como “Iceland Foods”, em razão de processo movido pelo país  Islândia contra a empresa britânica, sob argumentos de que o registro da marca “Iceland Foods” afetaria o comércio local islandês pois impediria que os comerciantes locais utilizassem em suas marcas a palavra “Iceland” (Islândia) para designar produtos e serviços.

A empresa “Iceland Foods” faz o uso do nome desde 1970 e se consolidou como uma das maiores redes de supermercados do Reino Unido. Por ora, o gestor comercial, Richard Walker, discorreu que será realizada uma tentativa de composição extrajudicial amigável com a Islândia, já que, sob sua ótica, não há riscos de associação indevida pelos consumidores dos produtos da rede de supermercados “Iceland Foods” com os produtos advindos do país Islândia (Iceland) , além de não impedir os comerciantes islandeses de utilizarem do nome para identificarem suas atividades comerciais 1.

E no Brasil, seria passível de registro de marca nomes de cidades, estados e países?

O Poder Judiciário tem decidido que é possível o registro de marca que contenha como parte do elemento nominativo, ente público, porém sem conferir exclusividade de uso do termo ao titular. Isso porque, assim como ocorrem com algarismos, letras, nomes genéricos e demais situações, a falta de associação a qualquer outro elemento que ofereça forma distintiva suficiente atrai a proibição do inciso II, do artigo 124 da Lei de Propriedade Intelectual (LPI) 2 por se tratarem de termos de patrimônio comum à coletividade, vedada a apropriação exclusiva por qualquer indivíduo 3.

Neste mesmo sentido, algumas decisões utilizam como fundamentação legal para justificar a mitigação da exclusividade dos nomes de entes públicos, o inciso IX do artigo 124 da LPI 4, que proíbe o registro como marca de indicação geográfica que possa induzir o consumidor em erro, discorrendo, em síntese, se tratarem de termos de domínio público para designar regiões geográficas - sejam munícipios, estados ou países – e, portanto, impossível atribuir monopólio do uso a um único titular* 5*

Além disso, é citado o impacto negativo à concorrência empresarial, por impedir que outras empresas com a mesma atividade identifiquem seus produtos e serviços por meio de expressões de uso comum 6.

Com relação ao Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, se verifica que há concessões de registros de marcas que utilizam de nomes de cidades, até mesmo conhecidas como Rio de Janeiro, São Paulo, dentre outras corroborando para diversas decisões administrativas de indeferimentos de pedidos de registros posteriores, fundamentados nos incisos V ou XIX do artigo 124 da LPI 7, os quais proíbem a reprodução ou imitação de marca alheia registrada ou título de estabelecimento comercial, e que resultam na busca pela tutela jurisdicional para retirar a exclusividade dos nomes dos entes públicos.

Mas afinal, é ou não possível o registro marca que contenha nome de ente público?

Em tese, há possibilidade da concessão do registro sem exclusividade sobre o termo, por isso é importante que o pedido possua outro elemento que componha o nome da cidade, estado e/ou país, a fim de evitar indeferimento, seja por reprodução de sinal comum, seja por imitação de marca de registro alheia.


1 https://metro.co.uk/2022/09/10/iceland-vs-iceland-uk-supermarket-takes-country-to-court-over-name-17343990/

2 Art. 124. Não são registráveis como marca:   II - letra, algarismo e data, isoladamente, salvo quando revestidos de suficiente forma distintiva;

3 TRF 2ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2006.51.01.518602-7, Juiz Federal Convocado MARCELLO FERREIRA DE SOUZA GRANADO, julgado em 11/11/2008, e – DJF2 Judicial 1 DATA: 19/12/2008

4 Art. 124. Não são registráveis como marca:  IX - indicação geográfica, sua imitação suscetível de causar confusão ou sinal que possa falsamente induzir indicação geográfica;

5 TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0005685-45.2013.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA, julgado em 06/07/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 13/07/2020

6 REsp 1.315.621-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 4/6/2013.

7 Art. 124. Não são registráveis como marca:   V - reprodução ou imitação de elemento característico ou diferenciador de título de estabelecimento ou nome de empresa de terceiros, suscetível de causar confusão ou associação com estes sinais distintivos;  XIX - reprodução ou imitação, no todo ou em parte, ainda que com acréscimo, de marca alheia registrada, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou associação com marca alheia;

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